GREP disserta: compreendendo as patologias da alma

Este é um espaço reservado para @s participantes do GREP - Grupo de Estudos em Psicanálise - debaterem quinzenalmente um tema levantado pelo grupo, algo que seja relevante e que enseje reflexão da comunidade acadêmica e da população geral sobre temas cotidianas e caros à psicanálise. A ideia desta coluna, portanto, é que @s própri@s estudantes se mobilizem a produzir uma reflexão pertinente e socialmente importante.

Publicado em 08 de maio de 2018

Paulo Emílio Gomes Nobre, estudante de Psicologia. Supervisão: professora Luciana Cavalcante Torquato.

No primeiro semestre de 2018, o Grupo de Estudos em Psicanálise (GREP) da Univiçosa decidiu concentrar seus esforços na compreensão das neuroses através do estudo da 3ª parte das Conferências Introdutórias sobre Psicanálise proferidas por Sigmund Freud entre 1915 e 1916.

As primeiras perguntas que surgem, então, são: por que estudar um texto publicado há mais de 100 anos e como ele irá nos ajudar a compreender as questões psicológicas da atualidade? Bem, antes de responder estas perguntas, precisamos entender algumas coisas.

A neurose é uma psicopatologia ou “doença da alma” que acomete os indivíduos, resultantes principalmente da forte repressão de um desejo inconsciente de natureza sexual, caracterizada pela formação de sintomas. Mas o que é isso? Desejo, repressão, inconsciente, sintoma, sexual? Vamos deixar o “psicanalisês” de lado e esclarecer isso melhor.

Desde que nascemos somos seres desejantes. Temos fome, sede e necessidades fisiológicas que precisamos satisfazer para viver. Nessa etapa da vida exercemos e somos impelidos por esse desejo de forma indiscriminada, sem nenhum tipo de regulação. E o desejo tem caráter sexual. Mas como assim? Calma! A ideia que se tem do que é sexual em Psicanálise é um pouco diferente do que é amplamente difundido. Sexual, em psicanálise, diz respeito a algo que excede (ou vai além) da pura satisfação do nosso instinto de sobrevivência. A bebê mama no seio da mãe para saciar a fome, mas também porque aquela atitude proporciona à bebê uma satisfação que vai além de seu instinto. A estimulação de sua boa causa um prazer que Freud chamou então de sexual, que faz com que o nenê continue sugando mesmo depois de sua fome ter cessado. Por isso então que a chupeta faz tanto sucesso!

No entanto, a satisfação indiscriminada dos desejos torna a convivência entre humanos impossível. Assim, para fazer parte da civilização devemos renunciar a algumas dessas pulsões. A própria sociedade se incumbe de criar mecanismos de repressão destes desejos e, em outras ocasiões, nós mesmos tratamos de reprimi-los. O inconsciente, esse lugar de fonte de energia, em sua maior parte inacessível a nossa parte consciente, não se contenta com essa repressão da necessidade de satisfação, criando o sintoma que substitui a satisfação do desejo reprimido. É aí então que surge a neurose!

Diferentemente do pensamento médico psiquiátrico da época (e porque não atual) Freud propôs escutar, analisar e compreender o que os sintomas queriam dizer a ele ao invés de eliminá-los. E ele chegou a uma conclusão surpreendente: os sintomas possuem uma narrativa, uma história, que leva ao núcleo da neurose. Em suma: os sintomas possuem um sentido, eles querem nos dizer alguma coisa! Cabe ao analista, juntamente com o paciente, olhar para este sintoma e analisá-lo, compreender o que ele está dizendo e livrar esta energia reprimida, oferecendo um canal melhor para o seu escoamento.

Desde que Freud começou a tratar as histéricas em seu divã em Viena no final do século XIX muitas coisas mudaram. Os avanços da ciência, tecnologia e medicina foram enormes. Assim como houveram grandes violências, guerras e ditaduras. O sofrimento e os sintomas adquiriram outras narrativas, mas o legado de Freud ainda permanece. Aprendemos com ele que devemos dar ouvidos a esse sofrimento, a esses sintomas, porque eles querem nos dizer alguma coisa. Há algo que precisa ser revelado no narcisismo, na depressão, no autismo, no borderline, na neurose obsessiva, na histeria, na psicose, enfim... A ideia de que os sintomas devem ser analisados e não extirpados e de que devemos estar atentos às novas modalidades de sofrimento humano provenientes da dinâmica do indivíduo consigo mesmo e com a cultura são lições valiosas que o fundador da psicanálise nos deixa e contribui de sobremaneira para a nossa formação profissional.

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA:

FREUD, S.  (1917 [1916-1917]b) Conferências introdutórias sobre psicanálise, terceira parte, Teoria geral das neuroses. Edição Standard Brasileira das Obras Completas de Sigmund Freud, vol. XVI. Rio de Janeiro: Imago, 1996.