GREP Disserta: Tecnologia, uma fuga?

Este é um espaço reservado para @s participantes do GREP - Grupo de Estudos em Psicanálise - debaterem quinzenalmente um tema levantado pelo grupo, algo que seja relevante e que enseje reflexão da comunidade acadêmica e da população geral sobre temas cotidianas e caros à psicanálise. A ideia desta coluna, portanto, é que @s própri@s estudantes se mobilizem a produzir uma reflexão pertinente e socialmente importante.

Publicado em 18 de abril de 2018

Karina de Araújo Ferreira, Karina de Oliveira Fialho, Nismaira Caetano de Paula. Supervisão: Luciana Cavalcante Torquato

“Pane no sistema, alguém me desconfigurou
Aonde estão meus olhos de robô?
Eu não sabia, eu não tinha percebido
Eu sempre achei que era vivo
Parafuso e fluído em lugar de articulação
Até achava que aqui batia um coração
Nada é orgânico, é tudo programado
E eu achando que tinha me libertado
Mas lá vem eles novamente e eu sei o que vão fazer
Reinstalar o sistema”

 Admirável Chip Novo, Pitty.

Observa-se, no sujeito contemporâneo, em sua relação com a tecnologia, uma tentativa por evitar o desamparo, esquivar-se do vazio, tendo em vista que esta fornece uma ilusão acerca da suspensão do mesmo. No entanto, como apontaremos ao longo deste texto, esta oferta parece se revelar ilusória.

À medida que se evita esse desamparo, nota-se também a redução dos encontros ao vivo, “olho no olho”: O encontro online vem substituindo o contato físico e a tecnologia comandando as rodas de conversa, contribuindo para o isolamento. A relação com o corpo se dissipa em função da máquina (MONTEIRO, 2017). Não é preciso ser um expert na área para ponderar o quão contraditório esse movimento se faz.

É indiscutível como grande parte da população é fiel às redes sociais, infectados por um vírus utilitarista e destruindo qualquer capacidade de obter bons diálogos. É possível bloquear, desbloquear em tempo real, produzir inveja [ou tentar produzir] nos outros a partir de fotografias nas quais é simulado estar realizando algum sonho mais ou menos banal que consta no ideário popular. É possível ter “milhares” de amigos sem ter ao menos um. É o simulacro de felicidade.

Assim, é possível identificar que o indivíduo possui duas vidas – a virtual e a real – e que há uma ruptura, disjunção, entre essas. Na vida real, esse sujeito precisa acolher as demandas do organismo, cuidar de um corpo, pelo fato de necessitar do alimento e demais cuidados básicos. Já na virtual, é preciso renunciar ao corpo, uma vez que esse se torna um obstáculo, devido às necessidades básicas. Observa-se que para estar na vida virtual, a  pessoa precisa permanecer conectada sem interrupção, esvaziando assim o corpo real do que lhe é necessário. Portanto, identifica-se que a tecnologia ocasionou um novo tipo de vício, um que diz respeito a uma dependência que atua diretamente no psiquismo (RAMÍREZ, 2017). 

A partir disso, nota-se que a vida real é a que frustra, castra e priva, enquanto a virtual é análoga às fantasias e à realidade psíquica do indivíduo. Além do mais, percebemos também que a vida virtual transmite uma ilusão, que está vinculada ao princípio do prazer, o que chama a atenção de jovens, uma vez que os afastará do princípio da realidade. Essa ilusão auxilia no afastamento de desconfortos ocasionados pela realidade, propiciando ao sujeito uma ilusão da satisfação plena, ausência do desamparo, o que ocasiona no sujeito uma rejeição à vida real (RAMÍREZ, 2017).

Mas percebe-se que tudo isso, proporcionado pela tecnologia, trata-se somente de uma ilusão, como bem já se sabe, devido à própria realidade, o próprio corpo exigirá uma necessidade. Nesse momento o sujeito mesmo não desejando se voltará à realidade, onde se frustrará. Além disso, compreende-se que há uma eterna busca pela plenitude, o que o indivíduo jamais conseguirá alcançar por se tratar da falta estrutural, e esta jamais será aplacada. O que nos permite questionar: quais serão os próximos artifícios utilizados nessa mesma tentativa, já que esta busca é contínua?

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

MONTEIRO, Lílian. O que tem deixado crianças e adolescentes tão tristes e depressivos? Como resgatá-los? Especialistas orientam. Acesso em:

RAMÍREZ, Elkin Mario. Adolescência e Redes Sociais Virtuais. In: LIMA, De Laguárdia Nádia et al. Juventude e Cultura Digital Diálogos Interdisciplinares. Belo Horizonte: Artesã, 2017. p. 79-89